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SOCORRO. ESTOU VIRANDO PAULISTANO.

setembro 1, 2016

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Já me acostumei à poluição e o ar puro me deixa anestesiado. Não olho mais no olho, não toco nas pessoas quando falo e adquiri certa resistência aos cariocas.

A mutação começou quando raspei a cabeça e coloquei um piercing na orelha. Inclui no meu vocabulário as expressões ‘Nooossa!’, ‘trampo’, ‘trocar idéia’, mas não falo ‘mano’.

Não como pizza com ketchup. Vou a lugares esdrúxulos como ‘Inferno’, ‘Carniceria’, ‘Drosóphila’, ‘Sarajevo’. Freqüento exposições, shows, festinhas, jantares, fondues, lareiras e afins.

Perdi minha mísera marca de sunga. Não lembro a última vez que fui à praia. Adoro o outono e desconhecia a modalidade ‘sol com frio’. Também aprendi a nunca mais tomar uma chuva de granizo.

Faço de tudo para não ficar na cidade no feriado. Já fiz uma viagem de oito horas que, sem trânsito, não levaria mais de três.

Descobri, em recente pesquisa, que cada habitante da Capital paulista está, no máximo, a 300 metros de distância de uma parede, um muro. Não é à toa que sou fã dos Gêmeos e dos projetos de Niemeyer no Parque do Ibirapuera.

Virei um workaholic. Passo mais de cinqüenta horas por semana dentro de um escritório branco, com persianas brancas, num ambiente climatizado, em frente a um computador, feito um rato de laboratório.

Uso roupas Cavalera, tênis Puma, escuto iPod, passeio pela Oscar Freire, admiro um punk, tive um retrovisor estourado por um motoboy. Já fui ao Ó do Borogodó ver um japonês (isso mesmo. Um japonês) tocar cavaquinho, numa banda de chorinho.

Fiz compras no Stand Center, na Santa Efigênia, mas nunca na Daslu. Me acostumei com crianças malabaristas, mágicas e que cospem fogo no sinal, sendo rejeitadas pelos donos de uma Ferrari.

E acabo de me dar conta que quando eu tiver um filho ele será paulistano. Vai falar ‘Quer que eu faço?’, ‘sussa’, ‘colocar a mesa de assim’, ‘parada nervosa’ e muito, muito ‘tipo assim’. Vai puxar o erre. Não usará plural. E o pior: será torcedor do Corinthians.

 

 

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Matheus Tapioca

BUZU NA BAHIA

julho 20, 2016

Rapaz, buzu em Salvador é uma onda. Não importa a distância, sempre vai ter um vendedor ambulante dentro. Se a viagem for longa, você é abordado, pelo menos, sete vezes.

Tem vendedor do picolé Paletas Falcão: cajá, coco, limão, tapioca (sim, tem sorvete de tapioca), amendoim, por apenas R$1,00. No inverno de 34º, hoje, todos os passageiros esvaziaram o isopor. O vendedor aproveitou o ônibus para ir pra casa porque já tinha vendido todos os picolés do dia.

Ruffles, Fandangos, pipoca doce, amendoins torrado e cozido; chocolate, halls, trident, barbeador, presilha de cabelo (“xuxa” na Bahia), plástico de documentos,  apenas 1,00.

Há também o vendedor das palavras de Jesus. Que morreu para pagar nossos pecados (coitado) e quem não seguir a Bíblia arderá no inferno para sempre. Nem os crentes suportam.

Até vendedor de escova de dente vende seu peixe. Isso mesmo! Compre três, pague R$5,00. Modelos para adultos e a nova linha “Kids”em formato de golfinho e  Princesa Frozen. Um sucesso.

Mas o melhor produto é a “Mãozinha”: aquele pedaço de pau com uma mãozinha na ponta para coçar a costas. “Pare de coçar as costas no canto da parede, na porta do banheiro. Com a mãozinha você pode coçar deitado no sofá, por apenas R$3,00“. Esse tá na minha lista de compras.

É proibido passageiro entrar com aparelho sonoro, mas a regra não fala do motorista. Pablo, Aviões do Forró, Veveta e Milk estão na playlist. Hoje vim para o trabalho escutando a narração da Bíblia por Cid Moreira. Impressionante, até acreditei na veracidade da história.

carinha_farinhaMatheus Tapioca

 

 

QUINTO DOS INFERNOS

fevereiro 7, 2011


Se não existir vida após a morte, é muita sacanagem! Nem que seja o inferno, mas tem que existir. Todo mundo nasce com uma religião e toda religião acredita na tal da outra vida.

Você sabe desde criança que deve ser honesto, generoso, bom, humilde, fiel, leal para não arder nas chamas do tinhoso. Sofre anos, se sacrifica, se humilha, se fode a vida inteira para acabar morto, sem uma segunda vida?

E o espírito onde é que fica nessa história? Não existe “espríto”? E o que é esse sentimento que temos uns pelos outros, num piscar de olhos, num sorriso, num beijo, num amor? Essa coisa que tem nome, mas não tem significado?

Muitos acreditam que precisamos evoluir como espírito nesta vida, para chegar num estágio mais elevado na próxima encarnação.

Isso quer dizer que se vim pobre e bonzinho nessa, na próxima serei rico? Então vai ter rico pra carambra na minha outra vida. E se eu voltar peixe? Nada?

Tenho uma amiga (ateísta, que acredita que morreu, acabou e ponto) que me disse: “Se a pessoa morre acreditando que há vida após a morte, para ela, haverá outra vida.”. Achei bonito, até poético. Mas, eu, preciso saber AGORA se vai ter ou não essa merda.

Se eu vou mudar? Claro! Não vou sair matando todo mundo, mas vou deixar de engolir muito sapo. 2012 tá logo aí! Para que vou me estressar? Não vou evoluir mesmo. Vou pra Bahia, pra Tailândia, pro quinto dos infernos.

E lembrar que você passou os melhores vinte anos da sua vida numa sala de aula para evoluir. “Saber que é humano/Ridículo, limitado/Que só usa dez por cento/De sua cabeça animal…”. É por isso que eu acredito em vida após a morte.

E se não tiver? É muita sacanagem!
Matheus Tapioca

carinha_farinha
Ilustração: Michel Neuhaus
Toda segunda uma nova crônica