BEM-VINDO A SÃO PAULO

Vida de desempregado é mesmo um sofrimento. Mas procurar emprego em São Paulo é uma penitência. Quando cheguei, passei dias batendo de porta em porta como um vendedor de enciclopédia. Claro que com menos conteúdo.

A primeira entrevista foi longe pra burro, como tudo em São Paulo. O cara me falou que cheguei tarde, pois já haviam contratado uma pessoa. E eu respondi: “Vocês montam uma agência tão longe assim, eu só poderia chegar atrasado…”.

Eu andava com o guia de ruas de São Paulo que são 650 páginas com mapas, nome de ruas, ônibus e o escambau. Eram o portfólio e o guia nas mãos e o coração na boca.

Logo em seguida, um redator me abateu, dizendo que não me indicaria para lugar nenhum, pois estaria fechando as portas. Meu trabalho não era bom e eu iria queimar meu filme indo a outros lugares. Viajei mais de mil quilômetros pro sujeito me falar isso?

Uma bomba sobre o Japão. A cidade estava com nove graus centígrados, ao meio dia. Usava luvas, gorro, ceroula e um casacão que não foram capazes de esquentar a frieza daquele homem.

Fui numa agência que fica na Marginal Pinheiros, longe como o estopô e me perdi a pé. Eram sete da noite, tudo escuro, quando passava por um terreno baldio, aconteceu o que só acontece comigo: fui assaltado duas vezes, no mesmo lugar.

No início do terreno, sai o primeiro assaltante e leva quase todo dinheiro. Cinco minutos depois, me sai outro ladrão no final do terreno. Fiquei sem dinheiro, sem entrevista e tive que pedir ao cobrador para passar por baixo da borboleta.

A essa altura eu já me sentia mais baixo que um cachorro. Queria minha mãe, meu calor de Salvador e um emprego qualquer. Ninguém pode dizer que baiano é preguiçoso, pois continuei assim mesmo.

Até que cheguei para o Diretor de Criação e disse: “Esta é minha pasta e vim trabalhar de graça para você.” O cara era muito doido, pois foi o único a acreditar em mim (até mais do que eu mesmo) e me contratou.

Falei todas essas besteiras para citar um poema de Mário Quintana que me fez resistir e ter chegado onde eu sempre quis estar:

“Se as coisas são inatingíveis… ora!
não é motivo para não querê-las…

Que tristes os caminhos, se não fora
a mágica presença das estrelas!”

Matheus Tapioca

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Matheus Tapioca

Matheus Tapioca

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16 Respostas to “BEM-VINDO A SÃO PAULO”

  1. Jaque Arashida Says:

    :)

  2. Karina Schubert Says:

    Me identifiquei muito com o texto! Só quem passa por isso sabe o que é.
    Vivi há pouco tempo quase a mesma situação, mas sem ser assaltada e no Rio de Janeiro…acho que é um pouco pior…enfim.
    bom texto =)

  3. andreia Says:

    Caramba, é isso aí! A a vida é uma batalha louca, zerar a quilometragem e começar de novo não é moleza, faz a gente sentir tanta coisa, mas daí vem as portas, fechadas, abertas, entre abertas e alguém inspirado que acredita na gente até quando nós mesmos duvidamos.Esse é o bom da vida:o beeemmm dpois…, pq no sufoco a poesia do Quintana, melhor escolha, fica tão difícil de enxergar!
    Aliás, vc já está num estágio favorável, tipo: já dá pra dar uma pedrada na cabeça do infeliz k menosprezou teu trabalho?!rs…é k sou da paz!
    AP

  4. Marcello Pace Says:

    Poderia ter ficado com calor de Salvador , não ser assaltado, mas tbm não ter carreira.
    Pode não ser a melhor cidade do Brasil mas com certeza recebe seus “estrangeiros” melhor q qq outra no Pais, e ainda te oferta oportunidades, resta fazer boas escolhas.
    BEM VINDOS ESTRANGEIROS!!!!!

  5. carina Says:

    Sabe o que eu acho mais legal? É que os românticos têm fé na poesia – acima de tudo :). (Fé que move arranha-céus de SP).

    bjos.

  6. Mel Says:

    O que seriam dos poetas sem a tristeza, dos sambistas sem traição e dos redatores sem certos babacas.
    Sem babacanas não teriamos textos tão bons.
    Tmb tive um BAbaca na minha vida. Mas a gente passa por cima, cresce e prova para gente mesmo que estávamos certos: o cara era um babaca afinal.

  7. Mary Bortolotto Says:

    Adorei! Autêntico e honesto.

  8. Daniel Says:

    Bem-vindo de volta… Seu trampo é muito bom, vc manda bem! Relaxa (e insiste) que as coisas vão acontecer.
    []’s

  9. Mariana Lima Says:

    Se eu te contasse as penurias de minhas buscas aqui na Espanha…
    Só nao tem assalto! Isso ja é uma vantagem da porra!
    Força capitao! Seu lugar ta reservado pq vc vale MUCHO MUCHO MUCHO!!!
    Beijo!

  10. Tereza Cristhina Says:

    Incrível como um ‘tapa na cara’ (sempre) ajuda. Precisamos disso as vezes.

  11. Andréa Says:

    Você já deu tantos passos, amigo. E adoro o Quintana!

  12. mali Says:

    Aiiiii quanto perrengue…
    Mas a luta é assim mesmo! Temos que ter paciência e perseverança, calma e controle
    Me dá o endereço do IDIOTA que te falou aquelas coisas horríveis, pois eu não tenho paciência, nem calma, nem muito menos controle. Ele vai ver com quantas baianas se faz uma briga boa!!! Como é que pode falar assim do trabalho do meu amigo?!?!?! Ora bolas… Hunf!

  13. Carol Chaves Says:

    Já disse e repito: o que vc tá fazendo aí que não veio pra cá até agora?
    Tenho certeza que com sua experiência tem um lugarzinho especial pra vc por aqui… O salário pode até ser menor mas com ele vem o trânsito menor, o stress menor, a poluição menor, o frio menor, o aluguel menor…
    Em compensação, o calor humano é maior, o pão de queijo mais quentinho, chega-se ao melhor lugar do mundo em 40 minutos e os amigos queridos são vizinhos.
    Uma lógica que não poderia ser desconsiderada…
    PS: Saudade grande… Quando vier, favor avisar com antecedência pra eu me preparar…

  14. maria helena Says:

    Bem vindo a São Paulo…então …rs

    bjs

  15. Felipe Says:

    animal!

  16. Karina Says:

    Mer apaixonei pelos seus textos!
    Sou paulistana, mas moro na Bahia á 10 anos, leio seus textos falando sobre a baianidade e sobre a cidade em que nasci e me identifico, lembro quando tentei voltar á morar em São Paulo, isso aconteceu á pouco tempo, não teve jeito, essa cidade pra mim só a passeio, ver amigos da adolescencia e família, porque AMO a Bahia, tenho alma baiana.
    Parabéns.

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